quarta-feira, setembro 18, 2002

EUA


ARCEBISPO NORTE-AMERICANO PEDE A BUSH QUE EXPLIQUE A SEU POVO PORQUE OS
EUA SÃO ALVO DE TERRORISTAS

Íntegra da carta enviada ao presidente George W. Bush pelo cardeal
arcebispo Bernard Law de Boston

"Senhor Presidente: Conte a verdade ao povo, senhor presidente, sobre
terrorismo. Se as ilusões acerca do terrorismo não forem desfeitas,
então a ameaça continuará até nos destruir completamente. A verdade é que
nenhuma das nossas muitas armas nucleares pode proteger-nos dessas
ameaças. Nenhum sistema 'Guerra nas Estrelas' (não importa quão
tecnicamente avançado seja, nem quantos trilhões de dólares sejam despejados nele)
poderá proteger-nos de uma arma nuclear trazida num barco, avião ou
carro alugado.

Nenhuma arma sequer do nosso vasto arsenal, nem um centavo sequer dos
US$270 bilhões gastos por ano no chamado "sistema de defesa", pode
evitar uma bomba terrorista. Isto é um fato militar. Como tenente-coronel
reformado e freqüente conferencista em assuntos de segurança nacional,
sempre tenho citado o salmo 33: "Um rei não é salvo pelo seu poderoso
exército, assim como um guerreiro não é salvo por sua enorme força".

A reação óbvia é: 'Então o que podemos fazer? Não existe nada que
possamos fazer para garantir a segurança do nosso povo? Existe. Mas para
entender isso, precisamos saber a verdade sobre a ameaça. Senhor
presidente, o senhor não contou a verdade sobre o porquê de sermos alvo do
terrorismo, quando explicou porque bombardearíamos o Afeganistão e o Sudão.
O senhor disse que somos alvo do terrorismo porque defendemos a
democracia, a liberdade e os direitos humanos no mundo... Que absurdo, senhor
presidente!

Somos alvo dos terroristas porque, na maior parte do mundo, o nosso
governo defendeu a ditadura, a escravidão e a exploração humana. Somos
alvo dos terroristas porque somos odiados. E somos odiados porque o nosso
governo fez coisas odiosas.

Em quantos países agentes do nosso governo depuseram líderes eleitos
pelos seus povos, substituindo-os por militares ditadores, marionetes
desejosas de vender o seu próprio povo a corporações americanas
multinacionais?

Fizemos isso no Irã, quando os marines e a CIA depuseram Mossadegh,
porque ele tinha a intenção de nacionalizar a indústria do petróleo. Nós
substituímos-lo pelo Xá Reza Pahlevi e armamos, treinamos e pagamos a
sua odiada guarda nacional, Savak, que escravizou e brutalizou o povo
iraniano para proteger o interesse financeiro das nossas companhias de
petróleo.

Depois disso, será difícil imaginar que existam pessoas no Irã que nos
odeiem? Fizemos isso no Chile. Fizemos isso no Vietname. Mais
recentemente, tentamos fazê-lo no Iraque. E, é claro, quantas vezes fizemos isso
na Nicarágua e outras repúblicas na América Latina?

Uma vez atrás da outra, temos destituído líderes populares que
desejavam que as riquezas da sua terra fossem repartidas pelo povo que as
gerou. Nós substituímos-los por tiranos assassinos que venderiam o seu
próprio povo para que, mediante o pagamento de vultosas quantias para
engordar as suas contas particulares, riqueza da sua própria terra pudesse
ser tomada por similares à Domino Sugar, à United Fruit Company, à
Folgers e por aí adiante.

De país em país o nosso governo obstruiu a democracia, sufocou a
liberdade e pisou os direitos humanos. É por isso que somos odiados ao redor
do mundo. E é por isso que somos alvo dos terroristas.

O povo do Canadá desfruta da liberdade e dos direitos humanos, assim
como o povo da Noruega e da Suécia. O senhor já ouviu falar de embaixadas
canadenses, norueguesas ou suecas a serem bombardeadas? Nós não somos
odiados porque praticamos a democracia, a liberdade e os direitos
humanos. Nós somos odiados porque o nosso governo nega essas coisas aos povos
dos países do terceiro mundo, cujos recursos são cobiçados pelas nossas
corporações multinacionais.

Esse ódio que semeamos virou-se contra nós para nos assombrar na forma
de terrorismo e, no futuro, terrorismo nuclear. Uma vez dita a verdade
sobre o porquê da ameaça existir e ter sido entendida, a solução
torna-se óbvia. Nós precisamos de mudar as nossas práticas. Livrarmo-nos das
nossas armas nucleares (unilateralmente, se necessário) irá melhorar
nossa segurança.

Alterar drasticamente a nossa política externa irá assegurá-la. Em vez
de enviar os nossos filhos e filhas ao redor do mundo para matar
árabes, para que possamos ter o petróleo que existe sob suas areias,
deveríamos mandá-los para reconstruir as suas infra-estruturas, fornecer água
limpa e alimentar crianças famintas. Em vez de continuar a matar
milhares de crianças iraquianas todos os dias, com as nossas sanções
econômicas, deveríamos ajudar os iraquianos a reconstruir suas estações
elétricas, as suas estações de tratamento de água, os seus hospitais e todas as
outras coisas que destruímos e que os impedimos de reconstruir com as
nossas sanções econômicas.

Em vez de treinar terroristas e esquadrões da morte, deveríamos fechar
a Escola das Américas. Em vez de sustentar a revolta, a
desestabilização, o assassínio e o terror em redor do mundo, deveríamos abolir a CIA e
dar o dinheiro gasto por ela a agências de assistência.

Resumindo, deveríamos ser bons em vez de maus. Quem iria tentar
deter-nos? Quem iria odiar-nos? Quem iria querer nos bombardear?

Essa é a verdade, senhor presidente. É isso que o povo americano
precisa de ouvir."

Bernard Law, arcebispo de Boston
\"Não basta que seja pura e justa a nossa causa, é necessário que a
pureza e a justiça existam dentro de nós.\"
Agostinho Neto

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