quinta-feira, junho 13, 2002

O sacrifício de Tim Lopes


por Eliakim Araújo do Direto da Redação

A morte do jornalista Tim Lopes é mais um desses crimes bárbaros que a cada dia vão ?enriquecendo? a crônica policial brasileira. Tim foi assassinado com requintes de crueldade por um bandido que, segundo os jornais, esteve preso alguns anos e acabou libertado pelo descaso da nossa justiça, lerda e incompetente. Tivesse ela sido mais expedita e, talvez, o assassino estaria cumprindo pena e a sociedade protegida de um perigoso delinquente. Quem sabe o Tim não estaria vivo a esta hora?

Mas o que tem chamado a atenção no assassinato de Tim Lopes é o gigantesco empenho dos jornalistas em defesa da categoria. A notícia do desaparecimento se espalhou por todas as redações e virou primeira página em todos os jornais. Na Globo, o JN de segunda-feira destacou em cada intervalo o depoimento de colegas do morto. O nome de Tim passou a ser citado copiosamente, além dos colegas, por policiais, políticos e governantes, todos querendo pegar carona no farto noticiário sobre a morte do jornalista.

Ante o clamor da imprensa, toda a polícia carioca se mobilizou, numa caçada sem precedentes. Becos e barracos foram revirados e em poucas horas dois membros da quadrilha estavam presos e confessavam o crime. A caçada agora é a Elias Maluco cuja cabeça está a prêmio por 60 mil reais. Fica provado mais uma vez que, quando é pressionada, a polícia atua prá valer e os crimes são descobertos rapidamente.

Será que era preciso que morresse um dos nossos, para que toda a mídia se conscientizasse de que a situação é insustentável há muito tempo? Terão os jornalistas maiores privilégios do que o cidadão comum? E por que invocar crime contra a liberdade de imprensa, se não são os criminosos que detêm o poder de aprovar ou proibir a divulgação de material jornalístico?

Discordo dos que têm assumido tal posição. Não consigo vislumbrar, nesse caso, nenhum vestígio de crime contra a liberdade de imprensa. Tim, na verdade, morreu em serviço. Fazia uma reportagem investigativa, com alta dose de risco, para a TV Globo. E a ela, somente a ela, cabe a responsabilidade civil pela morte de seu profissional. A verdade é que a liberdade de imprensa é maculada todos os dias nas grandes corporações da mídia, que determinam o que deve ou não ser publicado, de acordo com os mais diversos interesses.

Tim é um herói de fato. Merece todas as homenagens que está recebendo e as que estão prometidas. O que não podemos perder de vista são as milhares de vítimas anônimas da violência. Quantos pais e mães, quantos jovens perderam a vida nessa guerra civil diária que se trava em nossas cidades? São brasileiros anônimos que não eram jornalistas nem trabalhavam na Globo.

Tomara que a morte de Tim Lopes se transforme numa bandeira de luta e sirva de alerta aos nossos governantes. Vimos que com vontade politica é possível um combate eficaz ao crime organizado. Se isso acontecer, o sacrifício de Tim não terá sido em vão.

Sobre o autor: Foi noticiarista da Radio Jornal do Brasil, Âncora dos Jornais da Globo, da Manchete e do SBT. Ancorou o primeiro canal internacional de notícias em língua portuguesa. Vive em Miami, onde tem uma produtora de jornalismo e publicidade.

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